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Como ser fiel ao Código de Ética Médica na prática de telemedicina?

Como ser fiel ao Código de Ética Médica na prática de telemedicina? A vida humana se torna cada vez mais digital. Isso tem um reflexo direto sobre o comportamento e também na relação médico-paciente. Por isso, o médico precisa reavaliar os preceitos do Código de Ética Médica (CEM) com olhos sensíveis à saúde digital, especialmente quando pratica a telemedicina.

Neste post, o Saúde Digital vai comentar novas leituras do CEM dentro desse novo contexto sociocultural. Veja os temas abordados:

O comportamento humano e a relação médico-paciente no meio virtual

  • Desinibição
  • Comunicação virtual

Os artigos do Código de Ética Médica comentados e a prática da telemedicina

  • Princípios fundamentais da medicina
  • Sigilo médico
  • Documentos médicos
  • Publicidade médica

Quer praticar a telemedicina de forma mais segura? Acompanhe a leitura até o final!

O comportamento humano e a relação médico paciente no meio virtual

Desinibição

No mundo digital, o comportamento humano se modifica. Isso tem uma razão neurocientífica. Nosso cérebro evoluiu para responder a diversos estímulos. Os neurônios-espelho rapidamente captam as emoções transmitidas por:

  • olhares;
  • mínima facial;
  • mudanças leves no tom de voz;
  • odores;
  • agitação dos membros, entre outros.

Instantaneamente, em integração com o córtex pré-frontal, o hipotálamo e o hipocampo, isso nos comunica quais atitudes são permitidas, questionáveis, embaraçosas ou permitidas.

Sem encarar o olhar físico e a fala do médico, os pacientes podem fazer pedidos que considerariam inadequados presencialmente. Isso é mais provável em transmissões de mensagens de texto e áudio.

Da mesma forma, o próprio médico pode acabar cedendo mais facilmente a esses  pedidos ou, mesmo, acidentalmente cometer uma infração ética. Isso exige um cuidado especial do médico no manejo das sua relação médico-paciente mediada pela telemedicina.

Comunicação virtual

Outra mudança é a permanência das informações no meio virtual. Todas as suas interações com os pacientes podem ser facilmente gravadas por eles, o que demanda um cuidado redobrado em suas falas e ações transmitidas digitalmente. 

Mesmo as consultas presenciais podem ser facilmente gravadas uma vez que a maioria das pessoas tem acesso a smartphones com câmeras e gravadores de áudio. 

O médico, entretanto, deve adotar uma postura defensiva:

  • reavaliar posturas e crenças que são duvidosas ou contrárias em relação à lei e à ética;
  • manter uma excelente relação com o paciente baseada na ética e na confiança;
  • utilizar os registros digitais como aliados à documentação de suas posturas.

Veja a seguir alguns comentários dos principais artigos do Código de Ética Médica e como evitar infrações na sua prática de telemedicina. 

Os artigos do Código de Ética Médica comentados e a prática da telemedicina

Princípios fundamentais da medicina

I – A medicina é uma profissão a serviço da saúde do ser humano e da coletividade e será exercida sem discriminação de nenhuma natureza.

Fique atento sobre potenciais atitudes discriminatórias em relação à raça, orientação sexual, sexo, gênero, região, idade, entre outros pontos. A prudência deve guiar sua conduta profissional: mesmo que pense que determinados comentários são inofensivos, é melhor não fazê-los em redes sociais, teleconsultas, videoaulas, webinars e outros meios de comunicação profissional.

II – O alvo de toda a atenção do médico é a saúde do ser humano em benefício da qual deverá agir com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade profissional.

Na telemedicina, o profissional deve estar atento a evitar a comercialização da medicina. Por ampliar o acesso à saúde, a procura por suas consultas aumenta, então o médico deve manter uma duração de consulta razoável para não prejudicar o cuidado à saúde do paciente. Os ganhos financeiros são um direito do médico, mas não devem se sobrepor à humanização das consultas.

Sigilo médico

Art. 73. Revelar fato de que tenha conhecimento em virtude do exercício de sua profissão, salvo por motivo justo, dever legal ou consentimento, por escrito, do paciente. 

Parágrafo único. Permanece essa proibição: a) mesmo que o fato seja de conhecimento público ou o paciente tenha falecido; b) quando de seu depoimento como testemunha (nessa hipótese, o médico comparecerá perante a autoridade e declarará seu impedimento); c) na investigação de suspeita de crime, o médico estará impedido de revelar segredo que possa expor o paciente a processo penal.

Art. 74. Revelar sigilo profissional relacionado a paciente criança ou adolescente, desde que estes tenham capacidade de discernimento, inclusive a seus pais ou representantes legais, salvo quando a não revelação possa acarretar dano ao paciente.

As redes sociais podem trazer uma maior desinibição dos pais e do próprio profissional. Com isso, pais e responsáveis podem insistir no WhatsApp em saber sobre as relações pessoais, afetivas e sexuais dos filhos. O menor comentário pode fazer com que o paciente sinta que sua intimidade foi violada.

Art. 75. Fazer referência a casos clínicos identificáveis, exibir pacientes ou imagens que os tornem reconhecíveis em anúncios profissionais ou na divulgação de assuntos médicos em meios de comunicação em geral, mesmo com autorização do paciente.

Esse talvez seja um dos pontos mais problemáticos para os médicos no mundo digital. Muitos ainda acreditam que a autorização do paciente permite a divulgação irrestrita dos casos. Contudo o CEM proíbe qualquer forma de quebra de sigilo em meios de comunicação geral. Por isso, siga práticas defensivas como:

  • não marque seus pacientes no Instagram, Twitter ou Facebook quando estiver se referindo ao caso dele;
  • não faça anúncios ou páginas digitais em que a imagem ou os dados do paciente levem à sua identificação por terceiros. Utilize nomes fictícios e tarjas na face em imagens.

Com a facilidade de acesso à informação, o médico deve constantemente refletir sobre situações específicas do mundo digital que possam comprometer o sigilo.

Por exemplo, é muito comum o uso de iniciais para anonimizar o paciente. Entretanto, hoje em dia, os seguidores da rede social de um médico ficam disponíveis para visualização para terceiros. Então, é possível que um usuário busque os seus seguidores e encontre perfis compatíveis com a descrição do caso.

Art. 76. Revelar informações confidenciais obtidas quando do exame médico de trabalhadores, inclusive por exigência dos dirigentes de empresas ou de instituições, salvo se o silêncio puser em risco a saúde dos empregados ou da comunidade.

Na medicina ocupacional, é cada vez mais frequente a transmissão de atestados, laudos e prontuários digitalmente por e-mail, plataformas integradas ou mesmo por WhatsApp. 

Prontuários e exames complementares somente devem ser compartilhados entre os médicos que participam do exame do paciente ou da coordenação do PCMSO. Não envie os dados de saúde para gestores de RH ou técnicos de segurança do trabalho, pois isso pode configurar violação do sigilo.

Documentos médicos

Art. 80. Expedir documento médico sem ter praticado ato profissional que o justifique, que seja tendencioso ou que não corresponda à verdade.

É muito comum que o médico receba por WhatsApp pedidos de pacientes para que emita relatórios, laudos, atestados ou outros documentos médicos. Não há nenhuma vedação em confeccionar e enviar os laudos à distância se você tiver praticado um ato que justifique a emissão e o conteúdo corresponda à verdade.

Um exemplo de infração seria fazer um atestado para práticas de atividades físicas sem ter avaliado o paciente recentemente. Nessa situação, de acordo com seu raciocínio clínico, você pode agendar uma teleconsulta ou uma consulta presencial com o paciente. 

Algumas solicitações, como essa, podem parecer “inofensivas”. Contudo, não se esqueça que qualquer problema futuro poderá recair em sua responsabilidade médica.

Art. 85. Permitir o manuseio e o conhecimento dos prontuários por pessoas não obrigadas ao sigilo profissional quando sob sua responsabilidade.

Veja alguns cuidados essenciais com os prontuários:

  • Utilize prontuários eletrônicos que tenham ferramentas de controle de acesso de cada usuário. Assim, você pode definir o que cada funcionário do seu consultório pode ler;
  • Utilize ferramentas de teleconsultas com criptografia e outras ferramentas de segurança de transmissão de dados;
  • Coloque senha em todos os seus sistemas de prontuário eletrônico, mesmo que apenas você utilize os dispositivos;
  • Nunca compartilhe a senha dos dispositivos pelos quais você se comunica com seus pacientes. Isso inclui familiares e amigos!

Publicidade médica

Esse é outro ponto de atenção necessário aos médicos, pois frequentemente as normas éticas não são respeitadas.

Art. 111. Permitir que sua participação na divulgação de assuntos médicos, em qualquer meio de comunicação de massa, deixe de ter caráter exclusivamente de esclarecimento e educação da sociedade.

Art. 112. Divulgar informação sobre assunto médico de forma sensacionalista, promocional ou de conteúdo inverídico

Usar uma linguagem persuasiva para conscientizar as mulheres de que elas precisam realizar uma mamografia periodicamente dentro dos protocolos é permitido. Essa é uma recomendação de saúde baseada no benefício da saúde do paciente e nas evidências atuais. Nesse caso, o médico pode anunciar que oferece esse serviço. 

Por sua vez, viola o CEM um anúncio que busca convencer o paciente a respeito da necessidade do serviço daquele médico exclusivamente ou da superioridade de uma técnica sem embasamento para tal.

Art. 113. Divulgar, fora do meio científico, processo de tratamento ou descoberta cujo valor ainda não esteja expressamente reconhecido cientificamente por órgão competente.

Essa é outra infração frequente, ainda mais no contexto da Pandemia. Dentro do contexto científico, considera-se que as discussões são realizadas entre pares, que tiveram educação em metodologia científica durante a sua formação. 

A população em geral não apresenta conhecimentos técnicos suficientes para avaliar as evidências científicas. Então, anuncie apenas o que encontra respaldo científico.

Art. 114. Anunciar títulos científicos que não possa comprovar e especialidade ou área de atuação para a qual não esteja qualificado e registrado no Conselho Regional de Medicina.

Outra infração frequente é o anunciar ou dar a entender que tem uma especialidade sem ter um RQE registrado nela.

Por exemplo, o CFM considera que pós-graduações acadêmicas (especializações, mestrado e doutorado) não se equivalem ao título de especialista médico conferido pelos órgãos competentes. 

Então, por exemplo, apenas profissionais com RQE registrado em neurologia poderiam anunciar essa especialidade. Médicos que fizeram apenas especialização acadêmica em neurologia não poderiam.

Art. 115. Participar de anúncios de empresas comerciais, qualquer que seja sua natureza, valendo-se de sua profissão. 

Na Era da Influência Digital pelo Instagram, pelo TikTok e outras redes sociais, o médico deve estar atento para não se valer da profissão para participar de anúncios de qualquer tipo de produto.

Isso significa que o médico pode apenas participar quando os anúncios forem apenas informativos, respaldados por evidências clínicas. A autoridade de que o médico goza socialmente não pode ser usada para persuadir comercialmente o público.

Art. 117. Deixar de incluir, em anúncios profissionais de qualquer ordem, seu nome, seu número no Conselho Regional de Medicina, com o estado da Federação no qual foi inscrito e Registro de Qualificação de Especialista (RQE) quando anunciar a especialidade.

Nas redes sociais e nos websites, sempre que mencionar a profissão e a especialidade, insira logo após o seu registro no CRM e o seu RQE. 

Enfim, a evolução do mundo digital traz impacto na medicina e na forma como o médico deve ler o Código de Ética Médica. Mantenha sempre uma postura defensiva, refletindo sobre as suas condutas que podem trazer complicações éticas. No Saúde Digital e na nossa comunidade SDConecta, você poderá se atualizar sobre o tema!

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