Médicos precisam de cultura digital para inovar na saúde – Quem nos acompanha aqui no SD sabe que defendemos a necessidade de o médico promover uma transformação digital visando não só a carreira e os negócios em saúde, mas principalmente o paciente. Nosso objetivo é incutir a cultura digital nos profissionais em formação, nos recém-formados, e também naqueles que sentem na prática, após anos de estrada, a necessidade de se reinventar ou pelo menos acompanhar as rápidas mudanças que a ciência e a tecnologia nos impõem.
Ocorre que cultura digital significa mais do que simplesmente ter familiaridade com dispositivos eletrônicos, habilidades com apps e presença nas redes sociais. “Digital é quem faz a tecnologia e não quem joga videogame e é campeão mundial. Digital é quem cria o jogo, quem programa. Somos o terceiro maior país em uso de tecnologia, por que o Uber não nasceu aqui?”, provoca o empreendedor Carlos Julio, CEO da Digital House e comentarista da rádio CBN.
Carlos e seu filho Thiago Julio — médico radiologista, curador do CUBO Health e gerente de inovação aberta da Dasa, empresa de medicina diagnóstica que atua na fronteira tecnológica usando inteligência de dados para desenvolver algoritmos que auxiliam e agilizam exames clínicos — participaram de um bate-papo conosco sobre Empreendedorismo e Carreiras Digitais na Saúde (o conteúdo completo, em vídeo, você pode assistir aqui).
Um desconfortável cujo trabalho é difícil de explicar
Carlos é um empreendedor nato e Tiago um desconfortável nato. “Eu sinto um desconforto quando está tudo confortável. Gosto da confusão”, diz ele, ao explicar a inquietude que o levou a dar uma guinada na carreira bem sucedida de radiologista, com passagens pelos hospitais Albert Einstein e Sírio Libanês, para mergulhar no mundo da tecnologia da informação.
“Não preciso estar no cuidado direto com o paciente para fazer medicina. Estou fazendo medicina em escala através da tecnologia e do fomento ao empreendedorismo e inovação”, conta ele, cujo trabalho, que mistura TI e medicina, é mal-compreendido até pelos amigos. Segundo ele, sua mulher, que é fã da série americana Friends, costuma brincar que ele é parecido com o Chandler em relação ao trabalho: ninguém sabe direito o que faz.
Médicos precisam de cultura digital para inovar na saúde – Transdisciplinaridade em vez de multidisciplinaridade
Thiago é exemplo de transdisciplinaridade, ideia cada vez mais presente no mundo corporativo e um contraponto à multidisciplinaridade, um dos conceitos mais caros ao ensino da medicina nas últimas décadas. Para ele, a convergência de conhecimentos, o diálogo entre diversos saberes, é condição sine qua non para as soluções inovadoras que impactam, em ritmo cada vez mais maior, a vida profissional do médico.
No entanto, não é isso que Thiago vê nas faculdades de medicina. Há mais de sete anos ele é convidado a dar palestras em escolas pelo país sobre a convergência entre medicina e tecnologia. Apesar das revoluções do mundo digital nesse período, ele continua percebendo a mesma indiferença dos alunos em relação ao tema. Dos 100 a 200 alunos para quem ele fala em cada palestra, apenas dois ou três o procuram no fim da aula interessados em saber mais.
Estrutura curricular e mindset limitado das faculdades de medicina
É uma arrogância, afirma Thiago, motivada pela estrutura curricular e mindset limitado das faculdades de medicina. Como se sabe, o foco na formação profissional continua a ser o conhecimento técnico na área. O que continua a ser imprescindível, disso não restam dúvidas. Mas não é mais suficiente para o sucesso profissional e a experiência do paciente nos tempos em que vivemos.
De acordo com Thiago, para a quase unanimidade dos casos, a ficha só cai depois dos 10 anos de formação, quando o profissional entra de fato no mercado. “O cara que eu impacto é o recém-formado, não é o aluno”, diz ele, lamentando que o fato de a atual geração ser considerada a mais digital de todas não significa, na prática, interesse por transdisciplinaridade inovação.
O cerne da questão, como ficou claro na conversa com Carlos e Thiago, é que os limites profissionais estão esvaecendo. Cada vez mais o profissional é impelido a ir além da sua formação. São médicos que precisam olhar para gestão, para a tecnologia, para saberes extras que são a tônica da indústria 4.0. Qualquer um que se fechar num casulo de conhecimento e limitar demais as fronteiras verá sua competitividade no mercado ameaçada.
Médicos precisam de cultura digital para inovar na saúde – Resistência à telemedicina mostra carência de cultura digital
Talvez um dos maiores exemplos da carência de uma verdadeira cultura digital seja, no momento, a resistência da classe médica à implantação da telemedicina no país. “O médico de hoje é taxista de ontem jogando pedra no Uber”, compara Thiago. Para ele, não há razão para a telemedicina não ser empregada, pois já vem sendo usada com sucesso em países de primeiro mundo.
O problema, conforme Carlos Julio, é justamente a carência de cultura digital no país. Com trânsito entre grandes nomes do empreendedorismo brasileiro, Carlos diz que mesmo em C-level, ou seja, no alto escalão corporativo, ainda há pouco entendimento do que é a cultura digital.
“A cultura do digital é a cultura do erro, enquanto aqui ainda estamos na cultura do acerto. É a cultura das metodologias ágeis, do calendário semanal e não anual. Se nós não fizermos a transformação digital, não vamos fazer o catch up com o primeiro mundo”, defende Carlos.
Pessoas são mais importantes que tecnologias
E isso tem menos a ver com a tecnologia em si do que as pessoas, completa Thiago. “Na Dasa, o responsável pela transformação digital não é a TI, é o diretor de gestão e pessoas, o bom e velho RH”, conta ele, ressaltando que iniciativas e processos de inovação precisam partir de cada área da empresa. “Quem tem a meta de inovar é a área. É o jurídico, por exemplo”, explica, e não um time de inovação alheio a esse departamento.
Para os interessados em trilhar o mesmo caminho de transdisciplinaridade, Thiago recomenda força de vontade e disposição em vez de cursos formais. “Como eu fiz? Internet, madrugada, YouTube, cursos online, estudos de caso, participação em eventos, contatos pelo Twitter, me integrando ao ecossistema e aprendendo com os outros”, diz.
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