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Oncologia High-Tech: Bits e Bytes na medicina de precisão:Nenhuma área da medicina evoluiu tanto nos últimos dez anos quanto a oncologia. O início dessa revolução começou um pouco antes com o sequenciamento do genoma humano e se intensificou na década de 2010 com a inteligência artificial, big data e o entendimento dos vários subtipos de câncer existentes. Dois médicos oncologistas explicam neste artigo os avanços na área e contam quais são os principais desafios a ser enfrentados no país.

Nivaldo Vieira é diretor médico na Clínica Onco-Hematos e CEO da Hack2Health, uma plataforma de convergência digital que traz startups da área de saúde para mais perto de gestores, profissionais e pacientes. Sergipano formado em Aracaju, Nivaldo tem doutorado em oncologia com foco em biologia do câncer de pâncreas pela Universidade de São Paulo (USP).

Oncologia High-Tech: Na guerra contra o câncer, franco-atiradores em vez de tiro de canhão

Um efeito conhecido no tratamento tradicional do câncer é a morte de células não cancerosas que debilitam ainda mais o paciente. Isso vem mudando com o diagnóstico mais preciso da doença e, com isso, o uso de medicamentos que combatem apenas a célula mutada. Na guerra contra o câncer, portanto, o tiro de canhão vem sendo substituído pela precisão do franco-atirador.  

“Quando falamos de câncer de estômago ou de mama estamos falando de dezenas de doenças que molecularmente estão subdivididas. Foi o avanço tecnológico a partir do sequenciamento genético que identificou esses subtipos de câncer. O que gerou estudos clínicos com populações cada vez menores e drogas cada vez mais específicas para esses pacientes”, conta Nivaldo, destacando a velocidade com que as drogas usadas são atualizadas, pois com grupos menores, todo o ciclo de testes e aprovação também ocorre com mais agilidade.  

Big data é um dos pilares da revolução

Segundo Nivaldo, o uso de big data é um dos pilares dessa revolução. Ao se reunir, por exemplo, dados sobre casos raros de câncer de diversas partes do mundo é possível buscar  mudanças moleculares ou genômicas muitas específicas, e individualizar o tratamento. “A gente consegue atacar esses alvos específicos e ter uma altíssima chance de resposta em vez da baixa resposta e alta toxicidade dos métodos antigos”, diz o oncologista. 

Um outro aspecto interessante é o tratamento centrado no paciente. Nivaldo cita um estudo americano que mostrou que pacientes terminais com canal direto de comunicação com equipes multidisciplinares, as quais eles podem acionar a qualquer momento de acordo com seu estado de saúde, aumentou consideravelmente o tempo de vida desses pacientes.  

Desafio no sistema e saúde é a falta de digitalização de dados clínicos 

No Brasil, Nivaldo identifica como maior desafio a falta de digitalização do sistema de saúde. O médico ressalta que essa é uma etapa anterior à conexão, pois é necessário primeiro que todos os prontuários sejam eletrônicos e que os dados coletados sejam fidedignos, para então haver a conexão entre sistemas e dar resultado. “É um desafio gigantesco para a oncologia no Brasil”, afirma ele, ainda mais em um país continental com tamanha diversidade regional.

Biotecnologia surgiu de forma disruptiva

Marcelo Cruz é uma das referências em oncologia no país. Formado há 20 anos, ele acompanhou de perto as transformações recentes no campo da oncologia. “A biotecnologia veio de uma forma disruptiva, principalmente na área de oncologia e felizmente está se espalhando para outras áreas”, conta ele, que atua no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo.

O médico explica que nos últimos 15 anos a medicina tem compreendido melhor o mecanismo que as células cancerosas usam para se defenderem da quimioterapia e se multiplicarem. Isso resultou em terapias alvo nas quais medicamentos são usados para bloquear esse mecanismo de defesa e combater as células específicas que estão em mutação. 

“Hoje há vários tipos de testes de laboratório que determinam o tipo de câncer da pessoa, de modo a selecionar um tratamento individualizado. Com isso as taxas de sucesso, de controle e de cura são muito maiores do que nas terapias convencionais”, diz, citando principalmente os casos de câncer de pulmão, que possuem alta prevalência e mortalidade.

Oncologia High-Tech: Três desafios para envolvidos na área de saúde

Essa mudança disruptiva, no entanto, traz desafios para todos os envolvidos na área da saúde. Muitos deles ainda estão perdidos em meio a tanta novidade. No Brasil, Marcelo destaca três pontos que devem ser priorizados. 

O primeiro ponto é a disponibilidade de informação que os pacientes têm a seu dispor. “Antigamente, o paciente não chegava ao consultório tão informada sobre a doença. Hoje ele chega ao médico e já diz que ficou sabendo de um tratamento novo ou de um remédio novo”, afirma, destacando que o médico precisa entender isso para o paciente ser bem tratado. 

O segundo ponto é ampliar a comunicação entre médicos, pesquisadores e autoridades reguladoras. “A Anvisa tem se mostrado muito mais aberta. A aprovação de medicamentos tem sido mais rápida. Já tivemos vários exemplos de medicamentos aprovados nos EUA que foram aprovados aqui apenas dois ou três meses depois. É algo inédito”, comemora. 

O terceiro ponto é o maior desafio e está relacionado com as fontes pagadoras. Além da Anvisa é preciso buscar aprovação de outras duas agências para que o tratamento ou medicamento possa ser empregado nos sistemas público e privado de saúde. 

“São três agências para mostrar os mesmos dados e discutir os mesmos assuntos. Sim, é preciso discutir e tratar tudo com cuidado, mas, em última instância, o paciente não pode esperar. E aí ocorre a judicialização, pois se o remédio é eficaz e se a gente consegue identificar o alvo, mas não pode usar a biotecnologia porque depende de aprovação de A, B ou C, ocorre um grande gargalo que dificulta para o paciente receber o melhor tratamento possível”, conclui.  

Quer saber mais sobre como esses médicos têm usado a tecnologia na oncologia? Ouça o episódio do podcast aqui! Você tem alguma dica para dar para o Saúde Digital? Quer sugerir um tema? Sua participação é muito importante! Clique aqui para falar conosco.

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