O Código de Ética Médica (CEM) é o principal instrumento que temos para embasar nossas práticas de divulgação, marketing e publicidade médica. Mas você sabe o que ele diz? Muitos médicos negligenciam as normas do CFM sem perceber. Apesar de não haver uma fiscalização muito intensa, o médico deve adotar uma prática defensiva para evitar problemas no futuro.
Essas regras não valem apenas para quando você anuncia seus produtos e serviços. Sempre que você se declarar médico em perfis públicos e meios de comunicação em massa, precisará seguir o CEM e as outras resoluções sobre o tema.
Com a difusão do uso das redes sociais pelos médicos e da telemedicina, vejo muitos médicos adotando atitudes que podem trazer problemas no futuro. Por isso, vou explicar cada ponto do CEM em relação a esse tema. Acompanhe!
Art. 111 — Quais práticas são permitidas para a comunicação médica nos meios de comunicação com os pacientes?
Vamos a cada ponto dessa definição sobre publicidade médica:
- Assuntos médicos — são temas que envolvem condições de saúde, assim como sua semiologia, diagnóstico, prognóstico, terapia, entre outros pontos;
- Meios de comunicação em massa — qualquer meio de difusão rápida de informações, como redes sociais abertas, websites, programas televisivos, entre outros;
- Esclarecimento e educação da sociedade — as informações devem conter informações válidas dentro do que é bem estabelecido dentro do método clínico, que é baseado em evidências técnico-científicas individualizadas a cada caso.
Então, se o médico participa de uma publicidade (“publi” no jargão dos influenciadores) cujo objetivo é o convencimento de um paciente a determinada ação, ele abandonou o cunho educativo e adotou uma linguagem persuasiva. Isso é vedado, mas é cada vez mais frequente nas redes sociais.
No entanto, é permitido que ele faça uma postagem com informações relevantes em saúde, mas vincule a sua marca própria ou de um terceiro na imagem ou na legenda.
Art. 112 — Quais tipos de postagens o médico deve evitar nas suas redes sociais e websites?
É vedada a comunicação médica de caráter:
Sensacionalista — Vamos a um exemplo clássico: o caso da fosfoetanolamina. Logo quando estudos de bancada saíram mostrando uma potencial eficácia da substância na redução das neoplasias, muitos médicos foram às redes sociais divulgar a “promessa de uma cura para o câncer”.
Isso é uma abordagem sensacionalista. Apesar de não se basear em uma notícia falsa, ela exagera o fato. Isso pode ter efeitos danosos aos pacientes, que podem abandonar tratamentos com eficácia já bem estabelecida para um medicamento milagroso.
Promocional — aqui, o médico pode estar baseado em evidências da eficácia de uma terapia ou método diagnóstico. Contudo, na sua publicação, ele vincula um determinado produto comercial a esse resultado e chama o paciente para o consumo. Ele pode explicar os benefícios da terapia de forma geral e mostrar a marca, mas sem usar uma linguagem “convidativa” ou “persuasiva”;
Conteúdo inverídico — o médico precisa ter consciência de que ele tem uma função social. Por isso, o CEM proíbe que ele divulgue fake news e qualquer tipo de notícia falsa sobre um assunto de saúde. Então, a checagem de fatos é uma obrigação do profissional em suas comunicações com a sociedade.
Se você recebeu um print de um estudo interessantíssimo sobre determinado assunto, não o compartilhe com os pacientes no WhatsApp e nas redes sociais até verificar se ele existe e é válido.
Art. 113 — Médico pode divulgar ou comentar tratamentos nas suas redes sociais?
Sim, mas é preciso cautela nesse tipo de publicidade médica. Aqui, não expresso nenhum juízo de valor sobre algum tratamento específico. Apenas analiso o que está no CEM, está claro? Por essa norma, diversos médicos infringiram essa regra durante a Pandemia, — independentemente do viés político.
Dentro do meio científico e em conversas com outros colegas, não há nenhum problema em discutir tratamentos e descobertas promissoras. Por exemplo, se você estivesse em uma comunidade online para médicos ou grupo no WhatsApp, não haveria problema. No entanto, em posts que o paciente pode acessar, a questão é mais complexa.
O que eu proponho é uma prática defensiva para você no mundo digital. Afinal, as informações podem ser armazenadas permanentemente sem nenhuma possibilidade de controle.
Diante disso, é um risco divulgar nas redes sociais e outros canais digitais a respeito de tratamentos não válidos pela ANVISA ou por um corpo consolidado de estudos científicos sérios. Nesse sentido, a medicina baseada em evidências é uma ferramenta importante para o médico evitar problemas.
O oposto também é válido. Não podemos alegar a ineficácia ou o risco de uma intervenção médica sem o amparo adequado. Mesmo que você tenha uma pesquisa para se embasar, é preciso avaliar a qualidade, o número de indivíduos incluídos e a sua classificação dentro dos princípios da metodologia clínica.
Se você tiver alguma dúvida, consulte o modelo de pirâmide de evidências e os critérios de qualidade de um artigo científico antes de divulgá-la para o público amplo. Não leia apenas o abstract, faça uma análise crítica do estudo.
A direção do nosso Conselho Federal ou do seu CRM pode mudar a qualquer instante. Com isso, eles podem reforçar a fiscalização sobre as publicações médicas. Então, como as informações online potencialmente ficam armazenadas para sempre, você pode se ver em “maus lençóis” em algum momento por causa de uma publicação passada.
Art. 114 — Na publicidade médica, o que você não pode ao divulgar seu currículo para os pacientes?
O médico deve anunciar apenas os títulos técnicos, científicos e acadêmicos que possui. Com isso, não anuncie nenhuma curso que você não tenha um certificado de curso validado pelo MEC, — quando a lei exigir. Esse é o caso das pós-graduações lato e stricto sensu. Para cursos livres ou de curta duração, esse requisito não é necessário.
Além disso, o médico não pode divulgar, nem dar a entender, que possui uma especialidade para a qual não RQE registrado. Nem mesmo títulos acadêmicos, como mestrado e doutorado, podem ser anunciados se isso levar o paciente a entender que você é especialista.
Então, pela normas, sem RQE, o médico não pode anunciar nas mídias digitais:
- Pós-graduado em Psiquiatria;
- Doutor ou mestre em Psiquiatria;
- Psiquiatria;
- Psiquiatra.
Também é arriscado anunciar uma especialidade que ainda não é reconhecida pelo CFM.
Art. 115 — O médico pode participar de anúncios comerciais?
Esse dispositivo precisa ser interpretado e harmonizado com os anteriores. Se o médico participa dentro dos princípios da informação, ele não estará infringindo as normas éticas.
Para ficar claro, é permitido uma médica participar de uma publicação para explicar os benefícios da prevenção com a citologia do colo do útero com o logo de uma clínica. No entanto, se essa “publi” tiver apenas falando que essa é uma clínica excelente e que ela recomenda, há o risco de isso ser considerado um anúncio comercial.
Além disso, em publicidades não relacionadas à saúde, mas voltadas para o público geral, você não pode se anunciar médico. Ou seja, uma pediatra que participa de um anúncio de uma marca de roupa para crianças não poderia se declarar médico na peça publicitária nem divulgar esse conteúdo nas suas redes sociais.
Art. 116 — Como evitar o plágio na publicidade médica?
Esse dispositivo sobre publicidade médica é muito claro e busca coibir o plágio, que pode estar presente em situações aparentemente inocentes, como:
- Reproduzir imagem de estudos sem declarar a fonte;
- Plagiar postagens escritas ou visuais sem dar o devido crédito ao detentor dos direitos autorais;
- Copiar e colar um artigo no seu site como se fosse seu;
- Copiar os elementos visuais de uma marca, mesmo que modifique as cores. Afinal, a identidade visual também é protegida por direitos autorais.
Art. 117 — Como fazer a publicidade médica dos seus serviços?
Esse também é outro erro muito comum. Se você anunciou que é médico nas redes sociais ou em um site, seu CRM deve estar junto ao anúncio. Caso você divulgue ter uma especialidade, o RQE tem de estar junto.
Colocar seu CRM nas publicidades é essencial para que o paciente possa checar a veracidade do seu registro. Assim, podemos coibir a ação de quem exerce a medicina ilegalmente.
Por fim, para as pessoas jurídicas de produtos e serviços médicos, há outra regra adicional:
Parágrafo único. Nos anúncios de estabelecimentos de saúde, devem constar o nome e o número de registro no Conselho Regional de Medicina, do diretor técnico.
Essa regra também é válida para as empresas de emissão de documentos eletrônicos, conforme a nova norma do CFM, a Resolução RESOLUÇÃO CFM Nº 2.299/2021.
Por fim, é importante que o médico saiba que essas disposições do Código de Ética Médica sobre publicidade médica são normas mais gerais. O CFM tem outra Resolução, a CFM 1.967/2011, que explica mais detalhadamente quais são as regras de comunicação do profissional nas redes sociais, websites e outros meios de comunicação em massa.
Quer saber mais sobre essa Resolução e as estratégias de marketing médico ético? Clique na imagem abaixo e confira meu artigo sobre o tema!