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Soft Skills médicos: o que não está no Harrison

Por Augusto Gaidukas

Colunista Convidado. Estuda medicina e quer transfomá-la através do conhecimento e da tecnologia.

Soft Skills médicos: o que não está no Harrison – Numa era em que apenas diagnosticar e tratar não é o suficiente, não apenas porque o mercado médico se aproxima da saturação, mas também porque os pacientes estão cada vez mais exigentes, demandando atendimento personalizado e buscando ativamente por profissionais que não sejam apenas a média do mercado, é preciso desenvolver algumas competências que as faculdades não ensinaram; pelo menos, não até agora. 

“O médico que só sabe medicina nem medicina sabe”

Você não dificilmente enfrentou um paciente que chegou na sua frente querendo saber mais da doença dele do que você, tendo lido sobre a condição que porta em algum blog ou, então, com o diagnóstico pronto, querendo meramente que você prescrevesse exames e medicamentos. 

Em momentos como esses, é preciso tomar essa atitude do paciente como interesse em sua doença e até um comportamento pró-ativo, que pode ser convertido a seu favor. Em vez de ficar irritado, como muitos bons médicos ainda ficam, o médico excelente — e é por isso que você está aqui no Saúde Digital lendo isto –, como um assessor para assuntos de saúde de seu cliente, irá explicar calma e claramente ao paciente sua condição, numa linguagem empática e compreensível, de forma que o paciente não apenas volte, mas te recomende a outros pacientes. 

Esse é um dos exemplos de habilidades que aprenderemos ao longo deste artigo. Você já está preparado para elevar sua medicina à excelência, e nós chegaremos lá juntos.

Soft Skills médicos: o que não está no Harrison – Duas orelhas e uma só boca

A média, no Brasil, de tempo que o médico ouve o paciente até interrompê-lo é de 59 segundos. É isso mesmo: nós não conseguimos ouvir nossos pacientes por nem um minuto até parar a consulta com uma interrupção. Quando, em verdade, toda e cada informação que o paciente está te dando é relevante: nós não temos bola de cristal para perguntar sobre febre quando o paciente só referiu dor e não teve chance de continuar. Isso significa perda do valor preditivo positivo da nossa conversa e uma qualidade pior de assistência. 

Muitas vezes, em prontos-socorros ou agendas cheias é realmente difícil resolver a vida do paciente, mas mesmo o Método Clínico Centrado na Pessoa não preconiza isso — é necessário, em vez disso, resolver o que é mais relevante agora para então elaborar um plano terapêutico ao longo de semanas e meses. 

Para não pedir uma tomografia para uma cefaléia de um paciente que você interrompeu e que diria em seguida que essa dor vem toda vez que ele abusa da bebida alcoólica, é necessário ouvir. Ouvir, acolher e fazer o paciente se sentir seguro, desejoso de te ver novamente.

Soft Skills médicos: o que não está no Harrison – Liderando pessoas e constituindo vínculos

O médico é, via de regra, o líder das equipes de saúde. Ele pode não ser o coordenador ou o gestor (funções que não raramente são delegadas a enfermeiros ou administradores de empresas), porém, por uma questão lógica, onde tem medicina, tem médico liderando. 

Não é preciso montar equipes, escalas ou definir objetivos como um chefe para ser um líder. A liderança médica, na maior parte das vezes, é resultante da imposição do médico como portador do maior saber e visão dentre os membros de uma equipe conjunta. Então, você não precisa necessariamente estar lidando com subordinados para liderá-los. Isso ocorre de forma natural e intuitiva, boa parte das vezes, e depende da situação na qual o médico se encontra — desde um ambulatório universitário até uma equipe de emergência do SAMU.

A liderança — situacional, portanto — se baseia em analisar criticamente as situações e então usar os recursos materiais e humanos disponíveis para alcançar as metas e solucionar problemas. Ela é o modelo de liderança que políticos e líderes de governo utilizam em crises, e pode muito bem ser adaptada à prática médica. 

Ela pode consistir em apoio, orientação, delegação ou direção. Ao colocar-se como líder, você deve buscar numa dessas quatro posturas a forma que você e os membros da sua equipe trabalharão juntos por uma finalidade comum. 

  • Os peers fazem sua parte, e você reforça positivamente seus esforços. Isso é apoio.
  • Os peers são estimulados por você a cumprirem o que devem fazer. Isso é orientação.
  • Os peers têm controle sobre o trabalho e recebem tarefas a serem cumpridas. Isso é delegação.
  • Os peers são inicialmente orientados e encorajados a trabalharem à sua própria maneira com finalidade ao objetivo. Isso é direção.

Sem parecer leonino ou centralizador, você é capaz de conduzir com liderança a sua equipe fazendo força desses estilos de trabalho — e, obviamente, agregar valor ao seu trabalho sem precisar sentar numa cadeira montando planilhas e escalas para seus liderados.

Softskills e hardskills. Não se trabalha sem uma nem a outra. Fonte: CIS Assessment (2019)

Soft Skills médicos: o que não está no Harrison – Oferecendo uma experiência médica

Quando você vai a um restaurante, você não vai apenas comer. Se fosse apenas pela comida, você poderia preparar o prato em casa ou apenas pedi-la via aplicativo. Ao visitar um restaurante, você está lá pela variedade do cardápio, pelo ambiente, pelo atendimento, pela música e pelo conforto e bem-estar de estar se servindo num local diferente do refeitório do hospital.

Para os pacientes, é a mesma coisa. Quando um paciente sai da casa dele e vai até a sua clínica, senta na cadeira esperando ser atendido, se consulta com você e vai embora, ele está tendo a mesma experiência; mas, em vez de gastronômica, médica. Caso o paciente não quisesse ser consultado, ele apenas digitaria seus sinais e sintomas num buscador e compraria os remédios sugeridos na farmácia. Mas não é isso que ocorre: o paciente quer ser visto, atendido, tocado, acolhido. 

Desde a temperatura do ar condicionado da sala de espera até a forma que a sua secretária o trata e marca um agendamento para daqui um mês, o paciente está imerso ali dentro com um nome na mente: o seu. A experiência que você oferece a ele, desde o momento que ele entra, até o momento em que sai do seu consultório, é o que determina quanto valor se agrega ao seu nome e o quanto o paciente fica satisfeito com o tipo de assistência que você presta.

Oferecer uma experiência médica não consiste apenas em ter um consultório bonito, um jaleco limpo e apertar a mão do paciente ao entrar na sala. É preciso mais: é preciso desenvolver os skills mencionados aqui para que o paciente sinta-se à vontade e até feliz de estar ali, melhorando a relação médico-paciente e a percepção do valor da sua prática médica, permitindo a você arrendar pacientes no privado ou apenas construir uma reputação. 

Soft Skills médicos: o que não está no Harrison – O melhor médico

Quando eu entrei na faculdade de medicina, depois de muitas lágrimas e esforço, um dos meus mentores, um cardiologista muito querido, disse-me para “estudar muito e ser o melhor”. Eu levei isso a sério, e enfrentei mais exaustão durante a graduação do que na preparação para o vestibular, algo que comumente não ocorre: nós achamos que nossa vida está resolvida depois de entrarmos em medicina, que sempre estaremos empregados e que nosso salário sempre será abundante. 

O que eu não sabia, naquela época, é que o melhor médico não é que o sabe mais, ou o que tem o consultório mais bonito, ou o que usa o equipamento diagnóstico mais caro O melhor médico é aquele que oferece valor em suas consultas, combinando conhecimento, inteligência emocional, capacidade comunicativa e uma pitada de inovação — afinal, a medicina se renova a cada 6 meses. 

Ouça seu paciente. Seja flexível, lidere sua equipe, arbitre conflitos ao invés de criá-los e se comunique aberta e claramente. Seja você o melhor médico.

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