O CFM e a telemedicina estão entre os assuntos mais discutidos na comunidade médica desde o início da Pandemia de Covid-19. Depois de anos com uma lacuna na regulamentação dos teleatendimentos, eles foram permitidos em 2020 em caráter emergencial a fim de evitar uma crise assistencial causada pela necessidade de distanciamento social. Mas e o futuro da autorização da telessaúde, o que ele nos aguarda?
Apesar de inúmeras promessas de uma normatização definitiva do CFM para a telemedicina, ainda não temos sinal de uma resolução válida após o fim da emergência de saúde. Por conta desse limbo, muitos médicos não podem se preparar para o futuro.
Para que você não seja pego de surpresa, o Saúde Digital vai resumir os principais pronunciamentos feitos por autoridades do CFM. Além disso, vamos comentar o projeto de lei que busca legalizar a telemedicina, podendo ser aprovado antes mesmo da resolução do CFM.
Quer entender melhor? Acompanhe o nosso post!
CFM e telemedicina: qual o estado da arte?
O Conselho Federal de Medicina estabeleceu uma Comissão Especial para a elaboração de uma resolução definitiva para regulamentar a telemedicina. Ela é composta por 11 profissionais, sendo 7 deles conselheiros do CFM. Seu objetivo é a análise de mais de 2 mil propostas enviadas durante a consulta pública realizada sobre o tema.
Em setembro de 2020, o CFM publicou uma notícia na qual divulgou que esse grupo de trabalho já havia se reunido em 3 ocasiões e apresentaria uma minuta de resolução nos próximos meses. Depois disso, ela seria discutida pela plenária do CFM para ser aprovada. De acordo com essa publicação, a nova regra terá como princípios:
- Valorização da relação médico-paciente;
- Papel central do médico e do atendimento presencial;
- Telemedicina como ferramenta facilitadora do acesso;
- Privacidade de dados e do prontuário do paciente;
- Respeito à ética médica.
Estamos no final do primeiro semestre de 2021 e ainda há pouca informação sobre o trabalho da comissão e a conclusão do relatório que será acompanhado de uma sugestão de resolução. O que sabemos das deliberações vem de declarações dadas pelos representantes do CFM nas comissões parlamentares e discussões de projetos de lei sobre a telemedicina.
De acordo com a Dep. Adriana, nas discussões públicas que ela acompanha nas comissões, há três pontos mais polêmicos e que trazem maior divergência:
- A exigência de assinatura eletrônica com certificado digital padrão ICP Brasil;
- A possibilidade de exercer a telemedicina para atender pacientes de outro estado sem ter CRM registrado lá;
- A remuneração do médico.
O estado da arte da prescrição eletrônica pela telemedicina
Quando publicamos este post pela primeira vez em julho de 2021, havia os seguintes posicionamentos das entidades médicas e farmacêuticas:
- CFM — defende a assinatura eletrônica com certificação digital para a prescrição médica, pois acredita que permitirá o rastreamento dos receituários e a redução do risco de fraudes.
- Associação Brasileira das Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafarma) — defende que a certificação digital é uma tecnologia que já foi ultrapassada por técnicas mais modernas de autenticação. Seu uso traria limites e custos desnecessários aos sistemas de prescrição eletrônica.
- Projeto de Lei 1998/2020 — “Caberá ao órgão competente regulamentar os procedimentos mínimos a serem observados para a prescrição medicamentosa no âmbito da telemedicina”.
- Direção do DataSUS — a plataforma gov.br poderia ser utilizada para flexibilizar a assinatura e certificação digital. Ele afirma que é preciso buscar um padrão nacional para a prescrição médica digital.
- Direção da ANVISA — a assinatura eletrônica do profissional de saúde deverá conter também o certificado digital. Na dispensação, o farmacêutico também deverá assinar com certificado digital. Cada receita eletrônica somente seria utilizada para uma única dispensação de medicamentos.
No trecho do podcast acima, falamos justamente a favor da certificação digital para as assinaturas como forma de aumentar a segurança do paciente:
Costumo falar que um médico ser contra a telemedicina, é como se ele fosse contra a tomografia computadorizada. (…) Não faz nenhum sentido negar a utilidade dessa tecnologia. Tem que ser implementada de forma beneficiar o paciente. O médico deve lutar para que essa tecnologia chegue da melhor forma, da maneira mais ética, com prudência, com perícia e sem negligência.
Então, aqui no blog, fizemos a seguinte previsão:
Possivelmente, na regulamentação permanente, será necessário o uso de assinatura eletrônica com certificado digital no padrão ICP-Brasil ou uso de algum sistema oficial público. Por defender um maior rigor, o CFM tem dedicado esforços para que os médicos obtenham sua certificação digital.
Com a Resolução 2.299/2021 sobre a emissão de documentos médicos eletrônicos, essa questão foi resolvida. O CFM regulamentou a exigência de assinatura eletrônica com certificação digital padrão ICP-Brasil NSG-2 (nível de segurança 2). Ou seja, a nossa previsão estava correta:
Quer entender melhor a Resolução e os conceitos necessários para compreendê-la?
Antes da pandemia, apenas 22% dos médicos utilizavam a certificação. Atualmente, 57% dos 552 mil médicos no Brasil têm certificados digitais válidos. Com a colaboração do Conselho Federal de Farmácia, o CFM criou uma plataforma de prescrição eletrônica gratuita, que demanda o uso de um certificado ICP-Brasil. Lá, o médico pode emitir atestados, relatórios, pedidos de exames e receituários (exceto para medicamentos com receituário especial).
CFM e Telemedicina: algumas tendências da futura regulação da telemedicina no Brasil
O Saúde Digital tem acompanhado os debates legislativos sobre a regulação da telemedicina. Veja a seguir as posições que o CFM têm adotado nessas ocasiões e as divergências/concordâncias expressas por outras entidades:
Primeira consulta presencial
CFM — o vice-presidente do Conselho expressou o entendimento de que as primeiras consultas devem ser presenciais. Caso tenham sido feitas virtualmente, um atendimento presencial deve ser marcado em um curto prazo.
Associação Médica Brasileira (AMB) — O presidente da AMB, Dr. César Fernandes, apresentou a seguinte divergência:
“Deve deixar para o médico decidir se a primeira consulta é suficiente ou não. Trazer a necessidade obrigatória do exame físico ou da consulta presencial é anular, por princípio, a telemedicina. A telemedicina se baseia no pressuposto de que, em boa parte das circunstâncias, o médico tem todos os elementos necessários para bem fazer o diagnóstico e para orientar o tratamento”.
Associação Paulista de Medicina (APM) — o presidente da entidade, José Luiz Amaral, enfatizou que “há pacientes que podem se beneficiar da possibilidade de uma primeira consulta online”. Outros, porém, ficariam prejudicados. Por isso, acredita que essa avaliação deve ficar a critério do médico e não do CFM. Ele ainda completa:
“Imagino que a primeira, a segunda ou a terceira consulta, isso não deveria ser uma limitação ou uma obrigação. Isso deveria ficar a critério do médico que atende o paciente”.
Remuneração do médico
CFM — Ainda não há uma posição do CFM sobre o valor dos serviços de telemedicina em comparação aos presenciais. No entanto, há quase certeza de que o CFM vedará que os serviços de saúde remunerem as teleconsultas em valor inferior às consultas presenciais. Além disso, no Ofício CFM Nº/98, o órgão defendeu que a decisão pela telemedicina é um ato do médico.
Nesse caso, as operadoras e planos de saúde não poderiam “impedir o acesso via telemedicina de pacientes a todos os médicos credenciados, estando estes automaticamente autorizados a utilizar essa ferramenta com todos os seus pacientes, independentemente de aditivo contratual junto”.
AMB — as teleconsultas são um ato do médico e seu valor deve ser maior do que nas consultas tradicionais, pois demandam maior preparação do profissional.
APM — as teleconsultas são uma decisão do médico assistente e não poderiam ter remuneração menor do que a de uma consulta presencial.
Enquanto a resolução do CFM para telemedicina ainda não é publicada, o médico pode se adiantar e se qualificar com plataformas que oferecem gratuitamente a capacitação que ele precisa para conquistar uma vantagem competitiva no mundo virtual.
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